quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Sono.


Filha, há em seu sono qualquer coisa que encanta, qualquer coisa que é bela. Sou admirador confesso do seu dormir, velar seu descanso tornou-se algo indispensável em meus dias.

Ver você é feito respirar, intrínseco à minha existência. Tal qual um barco precisa de vento, eu preciso de você para velejar. E esses mares, nunca d´antes navegados por seu pai, andam finalmente fazendo meu viver ter sentido.

Você dorme, meu amor. E quem sonha sou eu.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Quatro meses.



Minha flor, hoje você completa quatro meses. Por causa disso, acordei respirando mais forte, como se fosse eu mesmo o aniversariante. Sim, há motivos de sobra para comemorar.

Você tem perfumado meus dias e, mesmo nas manhãs mais cinzas, o sol insiste em raiar dentro de mim. Graças a você.

Seus sorrisos, tão essenciais quanto o ar que respiro, tornam o mundo cheio de poesia, de encanto. Você me mostra a todo o momento que pequeno sou eu, um pai orgulhoso, feliz e que em alguns momentos fica prestes a explodir de tanto amor.

De tão generosa que você é, vive distribuindo charme para mim, oferecendo o melhor do seu precioso mundo. Tanto é verdade que, na foto que ganhei de dia dos pais, você olha para a câmera tal qual eu fosse a lente. No porta-retrato em cima de minha mesa agora, minha filha, vejo doçura e uma expressão terna. Trata-se de uma fotografia que revela uma paixão mútua, linda, infinita, interminável. E essa, eu faço questão de revelar.

Parabéns, meu amor.  

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Conversa de pai.

Oi, minha filha. Faz tempo que não escrevo para você. Desculpe essa demora toda, a ausência de palavras não reflete falta de amor e sim justamente o contrário. Conforme já disse anteriormente, meu tempo livre tem sido usado para ficar ao seu lado, descobrindo um mundo novo que você me mostra todos os dias.

Amanhã você completa três meses, veja só. E para a comemoração ficar ainda melhor, domingo é Dia dos Pais, o meu primeiro!

Essa semana ganhou uma graça especial, você agora conversa comigo. Sua pequena voz, seus sons, nada mais lindo já escutei nessa vida. Eu ainda não entendo o que você quer dizer, provavelmente o que eu falo também deve ser estranho aos seus ouvidos. Que importância isso tem? Frases são coisas de adultos. Coisa que quando fico contigo deixo de ser.

Eu amo você. Ainda mais, por incrível que pareça.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

O tempo que eu tenho é com você.


Luiza, você completa vinte dias hoje. E faz tempo que não escrevo para você, justamente no momento em que está mais presente em minha vida. Mas não estranhe isso, meu amor, tenho a explicação.

O tempo que usaria para redigir algumas linhas serviu para eu ficar mais perto de você. E ao invés de pensar em metáforas, carreguei você no colo, embalando o sono mais lindo que já vi. Preferi velar suas madrugadas a ficar na frente da tela do computador com a página em branco. Enfim, quis dar mais atenção à esta filha que, sem mais nem menos, chegou e roubou todos os meus pensamentos.

Minha pequena, escrevi menos. Porque você, definitivamente, é a melhor poesia que eu poderia um dia fazer.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Nascimento.


Filha, você veio no dia doze de maio de dois mil e onze. De surpresa, adiantada, seu pai levou um susto. Do prenúncio de seu nascimento à sua efetiva chegada foram quatro horas. De ansiedade, medo, felicidade.

Vi você sair da barriga da sua mãe, Luiza, quanta emoção!  Que palavras que nada, falar o que? Consegui sussurrar um “eu amo você” com a voz trêmula e fraca. Depois disso, mais uma espera torturante, você demorou a chegar no quarto.

Trouxe você para meus braços logo após o almoço que nem tive, comer pra que? Naquele momento, meu amor, senti tudo de melhor que um ser humano pode sentir. Você dormia, minha filha. E era eu que estava nascendo.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Aromas.


Ontem, ao voltar para casa, coloquei a cabeça para fora da van que me levava até o metrô. Queria apenas sentir o vento forte no rosto (por vezes uma simples brisa pode tornar um dia difícil mais ameno), porém ganhei mais uma surpresa: o cheiro de dama da noite que saía de uma casa.

Luiza, os aromas são importantes, sabia? Capazes de nos transportar para outro lugar, outra época, eles mudam nosso humor. O das flores que já falei anteriormente, por exemplo, me fizeram lembrar dos finais de tarde das férias escolares. Era um odor típico da pracinha que tem em frente à casa dos seus avós, eu brincava até anoitecer e estas plantinhas me ofereciam seu melhor. Eu era muito pequeno para perceber o valor disso, mas hoje eu me recordo com saudade.

Tem outros cheiros que me agradam - de comida da minha mãe, de mar, de café fresquinho. São tantos que poderia ficar escrevendo páginas e mais páginas, e não foi por isso que comecei esta missiva. E sim para dizer que, em breve, vou inaugurar o meu novo aroma predileto: o de filha que acabou de nascer.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Nosso lugar.


Luiza, quando você chegar vai perceber que o mundo é lindo. Não, não me refiro ao planeta que todos conhecem, estou falando do mundo que você, sua mãe e eu vamos construir juntos.

Nele, minha filha, você vai encontrar árvores cor de rosa, céu lilás e pés de pirulito. Flores vão nascer do asfalto e passarinhos estarão sempre por perto, já que conseguiremos voar.

Em nosso mundo vai ter livros do Ziraldo, desenhos animados e historinhas que inventei com tanto zelo que se tornarão realidade. E um montão de corujas para velar nosso sono mais tranqüilo.

Principalmente, minha pequena, você vai ver o amor que sinto por você. Ele é tão grande, tão presente, que você poderá tocá-lo.

terça-feira, 12 de abril de 2011

O que eu queria ser.


Filha, quando a gente é criança sonha muito. E no meio de meus devaneios infantis eu desejei muita coisa.

Quis ser astronauta e visitar o espaço (nos anos 80 achávamos que em 2000 estaríamos morando na lua). Quis ser também cientista maluco e inventar uma máquina do tempo. Rockstar sem camisa, cabeludo e tocando Heavy Metal foi meu sonho mais constante.

E já quis ser bombeiro, policial, centroavante da seleção. Até pensei em ganhar a vida como psicólogo, jornalista, escritor – profissões estas bem mais convencionais.

Virei publicitário por genética e vocação, músico nas horas vagas por ser a atividade do meu coração e pretenso poeta quando a inspiração vem.

Hoje não sei ao certo se todas as escolhas foram corretas. Mas guardo comigo, no lugar mais precioso do peito, uma convicção que descobri há pouco: o que eu na verdade sempre quis foi ser seu pai.

Estamos esperando sua chegada, meu amor.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

As joias que sua avó deixou para você.

Quando criança, eu me orgulhava muito de uma coleção de pedras. Não eram diamantes, rubis, esmeraldas e sim seixos encontrados na pracinha em frente à casa em que eu morava.

Apesar disso eu tinha a certeza de que era linda minha coleção. Quem mais me incentivou foi minha mãe. Lembro-me bem, eu brincando no tanque de areia e ela me chamava: “filho, vem ver a pedra chegada que eu encontrei”. Então levávamos para o local onde meu tesouro ficava, um cantinho do jardim da nossa residência.

Foi nesse tempo, Luiza, que aprendi a ver coisas com poesia. Sua vó Zezé quem me ensinou (provavelmente ela nem se dá conta disso). Porque só olhos líricos são capazes de enxergar graça nas pedras jogadas por um terreno qualquer.

Quero muito fazer o mesmo por você, minha filha. Tenho treinado bastante meu olhar para que, quando você chegar, eu consiga encher sua vida de poemas. E hoje, justamente exercitando meu lado mais sensível, lembrei-me desta história e pensei em colecionar pedrinhas com você. Elas podem não ser as mais bonitas, nem as mais caras. Mas são as mais preciosas que podemos ter.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Vivendo sem roteiro.


 Filha, quando você crescer um pouquinho vai descobrir, talvez até mesmo antes que eu consegui o fazer. O fato é que durante a vida somos todos um pouco atores. Vão passando os anos e percebemos que desempenhamos diversos personagens, às vezes propositalmente, outras sem querer.

Seu pai aqui já fez vários papéis memoráveis. Papel de vítima quando fora abandonado por uma paixão (coisas da adolescência). Papel de durão para parecer forte num momento difícil. Papel de palhaço por conta de gente que não vale nada. E papel de sensível, papel de amigo, papel de vilão, entre tantos outros.

Agora, estou prestes a fazer o papel mais importante da minha história, o de pai. Ando estudando para isso, milha filha, tomara que eu acerte. Ainda não sei muito como fazê-lo, porém tenho uma certeza: desta vez vou ser coadjuvante para você brilhar.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Raios solares.

Oi, minha flor. Hoje o dia amanheceu cinza. Acontece muitas vezes aqui em nossa cidade, você vai ver. Um ventinho frio embalou minha preguiça e, por conta disso, demorei um tempo a mais para sair da cama. Fiquei escutando o barulho do chuveiro, reconfortante sempre, pois ele me mostrava que você e sua mãe estavam por perto.

Manhãs assim me deixam levemente melancólico, sinto falta das cores da primavera. E o calor, mesmo quando reclamo, ao menos alegra a rotina do trabalho.

Não tive grandes inspirações até o momento, nem sorri o suficiente por tudo o que tem acontecido em minha vida. Confesso, vez por outra me sinto ingrato por isso. Mas o fato é que realmente as horas estavam sem graça. Pelo menos até agora.

Subitamente uma alegria terna invadiu-me o corpo e, de tanta quentura, cheguei a arregaçar as mangas. Não por uma boa notícia da televisão, nem por algo bacana do trabalho. A felicidade veio simplesmente porque lembrei que você vai chegar. E o sol brilhou dentro de mim.

Amo mais você a cada dia.


segunda-feira, 14 de março de 2011

Vou adorar assistir.


Eu comprei um DVD com vários episódios dos Trapalhões. Era o programa preferido da minha infância, passava aos domingos e, impreterivelmente, eu estava na frente da televisão neste dia.

Talvez você não goste, ache muito antigo, mas eu queria que você assistisse comigo um pouco. Luiza, eu demorei para saber disso, só percebo agora que também sou pai. Quando a gente tem um filho (no meu caso filha), volta um pouquinho aos tempos de menino e tenta reviver tudo. Mais do que isso, a gente pretende dividir os momentos de felicidade infantil com aquela pessoinha que acaba de chegar. E a minha felicidade dominical era ver as trapalhadas do Didi, do Dedé, do Mussum e do Zacarias.

Por isso, quando for a hora, prometo estourar um enorme balde de pipocas, comprar Coca-Cola e fazer um piquenique na sala de TV contigo. Você deita no meu colo, a gente coloca o DVD dos Trapalhões e assiste junto.

E se você achar chato, não tem problema, não precisa fingir, eu tiro o filme. Afinal, meu olhar não estará mais na tela e sim em você, Luiza, meu amor.

quarta-feira, 9 de março de 2011

O Carnaval ainda vai começar.


 Filha, não sei quando que você vai entender o que é Carnaval. Acontece uma vez por ano, as pessoas se vestem de um jeito meio esquisito, fazem coisas meio esquisitas e carregam uma alegria igualmente esquisita, sem motivo aparente. Mas é divertido, haverá o seu tempo de aproveitar essa folia tão tupiniquim.

Hoje é quarta-feira de cinzas, o dia em que terminam as festividades. E posso dizer que minha fantasia deste último Carnaval foi inédita em minha vida: a de pai.

Esqueci minha falta de talento para realizar tarefas manuais e montei móveis, arrumei a casa, tudo para deixar o palco pronto para sua chegada. Luiza, quando você chegar vai ser um Carnaval. E também vai ter muita alegria, mas com um motivo real para acontecer: você.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Espera.


Eu já esperei pelo violão dos meus sonhos numa esteira de aeroporto. Comprei em Nova York, cheguei no Brasil. Toda a bagagem em mãos menos o tão querido instrumento. Demorou horas, minha mãe que acompanhou a angústia no local disse que meu sorriso ao ver o violão foi único.

Esperei também algumas ligações. De uma paixão adolescente que nunca veio. De uma resposta de emprego que por fim foi negativa. De pessoas queridas para me desejar feliz aniversário. Toda a espera valeu alguma coisa, mesmo quando o telefonema não ocorreu.

Já tive que esperar minha irmã trocar de roupa para sair à noite. Somos compreensíveis com namoradas, com irmãs nem tanto. Fiquei debaixo da escada impaciente. Ao vê-la arrumada, mais nervoso ainda me senti. Difícil ver aquela criança de repente aparecer pintada de mulher para seus amigos babarem.

E esperei muito mais: um pedido de desculpas, um abraço sincero, um pouco mais de compreensão. Aos trinta e cinco já vivemos todo tipo de espera. Quer dizer, quase todo.

Hoje, Luiza, espero sua chegada. Essa é inédita e incomparavelmente mais preciosa do que qualquer outra. Causa ansiedade, um pouco de receio, muito amor.

Seis meses já voaram. E não espero nada a mais, quero apenas que você venha.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Balas coloridas e proteção.


Sou do tempo da bala Soft, filha. Nem sei se ainda existe tal guloseima. E muito menos sei se um dia você vai conhecê-la.

As Soft eram coloridas, lindas, porém bem duras e escorregadias. O terror de pais, pois não conseguíamos mastigá-las e, por isso, ficavam por horas na boca. Um perigo, num deslize fatal, a bala entrava por nossa garganta e ficava entalada causando engasgos, tosse e outro sintomas indesejáveis.

Garçons adoravam dar balas Soft para as crianças após uma refeição. Seria uma vingança pela bagunça, sujeira e barulho exacerbados? Pode ser.

Por que estou contando isso? Pelo simples fato de que agora, mesmo antes de você nascer, sei como funciona a cabeça de um pai preocupado. E também entendo a vontade de não tirar um momento de prazer do filho.

Vai chegar o dia, Luiza, que muitas balas Soft estarão pelo seu caminho. E você vai me olhar com aquela expressão de “posso, pai?”

Acho que vou dizer sim nesta hora, minha filha, apesar de não querer que você engasgue como eu o fiz certa vez. Não fique brava comigo se isso acontecer. Será meu jeito de ensinar que um momento de doçura sempre vale a pena, mesmo que ele venha acompanhado de nó na garganta.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Meninos também choram.


Ontem eu chorei, minha filha. Pode ser chocante para você, mas saiba desde já que adultos também choram.

Eu era crescido quando percebi pela primeira vez meu pai aos prantos e, confesso, a cena me assustou. Sabe, quando a gente é criança pensa que nossos pais são super heróis, imbatíveis, inabaláveis. E vê-lo assim tão triste, a ponto de deixar escaparem as lágrimas em minha frente, foi um fato marcante em minha juventude. Passou. Hoje sei que é normal.

Mas meu choro de ontem foi de outro tipo, um que você também vai experimentar. É o  de quando ficamos felizes. É gostoso quando acontece desse jeito, pode acreditar.

Tem sido frequente, Luiza, penso em você e meus olhos acabam ficando marejados. Gosto de tentar imaginar como é seu rosto - será que você vai se parecer comigo ou com a mamãe? Nessa brincadeira de adivinhar também tento descobrir do que você vai gostar, de boneca, de música, de dançar? São tantos pensamentos que me invadem, acompanhados de sentimentos tão extremos, que não agüento, a emoção toma conta de mim.

Talvez um dia você chegue em casa e me encontre chorando. Se me vir deste jeito, minha filha, não precisa se preocupar. Dê-me um abraço, seguido de um beijo estalado na bochecha. Tanto faz se o choro for de tristeza ou de alegria: seu carinho será bem vindo em qualquer situação.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Você é menina, que sorte!


Luiza, hoje numa reunião entre homens soltaram a fatídica frase: “mulheres são muito complicadas”. Nós garotos (pois é, não crescemos nunca) teimamos em repetir esta oração feito um mantra, deve ser justificativa por sermos tão óbvios.

Meninas são diferentes, eu bem sei. E ter descoberto que você, filha, seria uma delas causou-me a princípio certo medo, sentimento que posteriormente transformou-se em imenso afeto.

Lembro-me bem do dia que soube seu sexo. Sua mãe e eu no laboratório, o segundo ultrassom. E o médico mostrava seu fêmur, seus pulmões, seu aparelho digestivo, nada de dizer sobre o assunto. Até que finalmente você resolveu nos dar essa surpresa, quanta emoção. Fiquei sem palavras durante um tempão.

Desde então tenho exercitado minha sensibilidade, sei que ser pai de menina não é tarefa fácil. Fácil é conviver com homens, falar de futebol, boxe, carro. Árdua tarefa encantar-se com flores, chorar no final do filme, perceber a hora certa de fazer carinho.

Não serei infalível, minha filha, mas prometo usar tudo o que tenho para fazer você feliz. Tanto quanto você já me faz.

Eu amo você de um jeito que chega a doer. Beijinho do seu pai.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Despertando.

Filha, tem um verso de um grande poeta, dos meus preferidos que diz: “Quando te vi amei-te já muito antes . Foi o que senti quando olhei para você pela primeira vez no dia do ultrassom. Não dava para enxergar muita coisa, mas pude notar seu contorno, seus bracinhos, suas perninhas.

Aquela imagem, em preto e branco, foi a mais emocionante que já vi. Mais que uma tela de Renoir, mais que um filme de Wim Wenders.

E como disse Pessoa na poesia, eu já a amava antes disso.

Ser pai tem dessas coisas. Descobrir um antigo amor que já existia, latente, esperando para brotar. E olha que eu nunca antes havia pensado em filhos, de repente vem você. Para despertar minha sensibilidade. Para reconstruir meu mundo. Para me fazer crer que antes disso nem existia vida.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Final de semana a três.


Bom dia, meu amor. Hoje é segunda-feira, começo da semana, a gente tem que pegar no tranco. Um dia você vai entender a expressão.

Mas o fim de semana foi ótimo, ficamos ajeitando nossa casa. Agora falta pouco, Luiza, dentro de alguns dias estaremos morando juntos, nós três.

Você percebeu como sua mãe tem preparado tudo com tanto zelo e afeto? Pude observá-la arrumando um armário, ela o fazia como quem lapida a mais rara de todas as joias. Parece pouco, mas achei um ato comovente.

Descobrimos que a padaria em frente de casa vende um franguinho delicioso, será o almoço de vários domingos. Foi o nosso primeiro em casa e, de novo, a mamãe arrumou a mesa improvisada com todo o amor que ela sabe dar. Momento delicioso e inesquecível, tomara que você também tenha sentido isso.

Antes de ir embora, alisei você, beijei você. E fui dormir. Do jeito que só o mais feliz dos homens consegue.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Estou procurando um realejo.



Bom dia, meu amor. Hoje ao vir para o trabalho escutei Realejo do Chico em meus fones de ouvido. Filha, eu adoro ouvir música quando estou no trem. As canções fazem um contraste com a correria da cidade, acabo por viver algo surreal. Enquanto pessoas olham os relógios, andam apressadas, eu fico fechado em meu mundo cheio das canções que mais amo.

O fato é que tal realejo me fez pensar. “Ninguém mais quer hoje em dia acreditar no realejo” – diz Buarque, que na sequência anuncia sua venda. E olha que o “hoje em dia” citado é bem mais antigo que seu próprio pai, pequena Luiza.

Eu queria um dia poder mostrar um realejo para você, tomara que ele não esteja extinto quando você ficar grandinha.

Em meu sonho vamos juntos andando de mão dadas, de repente você se encanta com o pequeno papagaio dentro de uma caixinha amarela de madeira. Um moço de suspensórios e boina roda a manivela e uma valsa preenche a praça. Pego o bilhete do bico do bichinho e leio em voz alta para você: não fique procurando a felicidade, ela está de mãos dadas com você.    

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Coisas gostosas de comer e de sentir.

Um dia você vai descobrir, minha filha, que uma das coisas mais gostosas do mundo é comer um Sonho de Valsa. Se o bom-bom for desses que a gente ganha de alguém querido, de surpresa, melhor ainda.

Agora, já com trinta e cinco anos, tenho uma técnica desenvolvida para degustar o chocolate. Funciona assim: dou uma pequena mordiscada na casquinha, com zelo suficiente para que meus incisivos não cheguem ao recheio. Imediatamente a parte de fora é partida em duas metades milimetricamente calculadas. Então, ingiro primeiro a parte da casquinha sozinha, pura. Sobra um recheio metade com casca, metade sem. Nesta hora como só a parte de dentro sem a casca. Fica faltando meio Sonho de Valsa montadinho, que mastigo de uma vez terminando o ritual.

Refleti hoje porque faço isso. Acho que é para sentir todos os sabores que o bom-bom tem: primeiro só a casca, depois só o recheio, depois os dois juntos. É minha mania de sentir as coisas ao máximo, com chocolate não é diferente. Com meu amor por você também não.

O mundo pode ser colorido.

Faz um calor de Senegal nessa cidade, minha flor, espero que dentro da barriga da sua mãe você não sinta. Aliás, passei um tempo dessa madrugada olhando para você aí dentro, não sei se percebeu.

Velei o sono de vocês duas no silêncio da noite, no escurinho, até eu conseguir pegar no sono. Sabe, sua atual casa é bem redondinha, tem formado de uma bola de capotão. Acho que deve ser confortável. Às vezes eu a beijo e acaricio torcendo para que você sinta o afeto excessivo que transborda de minha pele.

Quando acordamos hoje, não tive vontade de vir trabalhar. Queria continuar ali contornando a barriga com meu olhar, desenhando ao seu redor linhas imaginárias de belezas.

Hoje eu queria falar justamente sobre isso: belezas. Luiza, durante a vida muita gente vai tentar convencer você que o mundo é feio. Olha, ele realmente é repleto de coisas ruins. Mas aprendi, podemos guardar conosco todas as lindezas que existem.

O mundo é do jeito que a gente vê, meu amor. Por exemplo, onde muitos viram uma cebola, Neruda viu poesia. Manoel de Barros já escreveu sobre formiga. É a prova de que até as coisas mais elementares podem deixar a vida especial.

E se um dia, minha querida, você ficar descrente disso tudo, olhe nos olhos da sua mãe. Lá mora toda a beleza do mundo.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Bailarinas e borboletas.




Sou apaixonado pelas bailarinas do Degas. Quando penso na síntese da delicadeza imediatamente me vêm à cabeça tais figuras.

Acho que também vai gostar delas, Luiza, porque sua mãe vive falando que você está dançando aí dentro. E seu balé parecem borboletinhas internas segundo ela me explicou. Isso eu ainda não havia sentido.

Mas hoje, justamente hoje, eu pude perceber como é esta sensação. Tais borboletas foram parar dentro de mim, talvez tenham voado para meu corpo aproveitando um dos muitos beijos que dou em sua mãe. Ou simplesmente usaram um sonho e invadiram-me a alma sem pedir permissão.

Amanheci flutuando graças ao bater de asas dos bichinhos. Era meu amor saindo do casulo.  

Pai também sente medo.


Sabe, filha, vez por outra sinto um pouco de medo. Quero muito ser um bom pai. Um tão bom quanto o meu. Aliás, tenho certeza de que você vai adorar o seu avô, um adulto com olhos poéticos de criança. Ele já está apaixonado por você, acredite.

Mas eu, que achava que esta coisa de paternidade estava há milhares de quilômetros de mim, me assusto um pouco. Porque eu quero saber educar você, repreender na hora certa, nunca ser omisso. Quero poder minimizar todos os seus traumas, ser seu amigo e entender até suas frustrações amorosas quando estiver grandinha. Lhe dar colo, atenção e ter ouvidos atentos ao que você tem a dizer.

Tudo isso, minha pequena Luiza, é assunto novo. E se me amedronto tanto é porque gostaria de ter um poder inexistente: o de controlar o mundo para que nunca alguma coisa lhe cause dor.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Sobre flores e nascimento.


Sentir não exige ordem cronológica. Deve ser por isso que as palavras que escrevo a você não coincidem com os acontecimentos. Escrevo hoje o que senti há meses e posso redigir amanhã sobre uma lágrima que ainda vai cair. E não é assim o amor? Que desperta de repente de um estado de absoluta criogenia nos dando um frio na espinha quando menos esperávamos?

Digo isso com convicção, pois sou um homem de amores. Um dia você vai perceber, Luiza, o quanto seu pai pode ser emotivo. Chega a ser piegas, espero que me perdoe por isso (prometo não lhe envergonhar da frente das amigas com meus acessos de sentimentalismo).   

Porém, um amor como esse é inédito em minha vida. Hoje li que você deve estar com vinte e um centímetros. Menor que a régua da minha mesa. Porém, meu sentimento é sem medida, como pode? Melhor nem tentar entender.

O fato é que penso em você o tempo todo. E daqui da janela de meu novo emprego, vendo uma simples árvore cheia de flores roxas, lembrei que você existe e está bem guardadinha na barriga da sua mãe, meu outro grande amor. E você também vai desabrochar, minha linda. E vai ser tão bonito, tão cheio de paixão, que as pobres flores vão morrer de inveja de você.

Historinhas.


Escolhi seu nome porque é também o nome de uma música bem bonita, de um homem igualmente lindo que se chama Antônio. Dizem que a canção foi feita por encomenda para uma novela da Globo, mas não me lembro, isso é história que me contaram. E eu adoro histórias.

Ando cá comigo inventando algumas para você. Ah, você há de gostar de escutar as aventuras que ando preparando. Pode ser durante o dia, pode ser antes de dormir. Guardei comigo vilões terríveis e heróis que vão salvar a sua vida. Assim como você salvou a minha.

*Ilustração da sua mãe, Renata Antunes.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Carta para você.

Filho (ou filha),

Faz ainda pouco tempo que soube de você. Confesso, sinto-me ligeiramente perdido. Deliciosamente perdido. Feito motorista que esquece o caminho ao admirar a paisagem bonita da janela, feito o viajante que, num país estranho, nem liga se vai chegar a algum lugar pois as novidades são muitas.

Ser pai, que coisa mágica, meu pequeno. É de perder o fôlego, é de sentir frio na barriga, é de vir aquele arrepio na espinha. Grande descoberta: eu já amava você antes da concepção. Hoje sinto mais amor ainda. Saber que você existe é como respirar, essencial, necessário, obrigatório.

Por falar em coisas bonitas, você precisava olhar para sua mãe agora (se é que já não o faz). Ela está mais linda do que nunca. Um brilho no olhar que ninguém consegue apagar, uma luz que ofusca tudo, estonteante. Não sei se hoje vocês são duas pessoas, talvez sejam uma só por enquanto, toda essa delicadeza da maternidade é assunto deveras difícil de entender para nós machos.

Ah, que confusão, meu amor. Os últimos dias foram repletos de sentimentos difusos, com milhares de incertezas, porém uma verdade é absoluta: vocês são o motivo da minha existência.